O LADO OCULTO DA LEITURA E DO ESTUDO

    


        "Há um lado oculto em todo ato da vida quotidiana; muitas vezes, conhecendo-o, nós podemos cumprir mais perfeitamente ou mais utilmente esses atos diários.
            Vejamos, por exemplo, o caso da leitura. 
     Falando em termos gerais, é com duas finalidades que nós lemos: o estudo e o passatempo. Olhando-se com a visão clarividente para uma pessoa que esteja lendo e estudando, poderemos ficar surpresos em ver como penetra pouca coisa da real significação do que está escrito, na mente do leitor. Em um livro que seja cuidadosamente escrito com objetivo de estudo, cada proposição ou cada parágrafo contém geralmente uma exposição clara de uma ideia definida. Esta ideia se expressa como uma forma-pensamento, cujos contornos ou dimensões variam com o assunto. Mas, seja ela pequena ou grande, simples ou complexa, é pelo menos nítida e precisa quanto à sua espécie. Em geral é rodeada de várias formas subsidiárias, que são as expressões de corolários ou deduções necessárias daquilo que se expõe. Pois bem: uma imagem exata de tudo isso, que é a forma-pensamento do autor, deve construir-se na mente do leitor, seja imediatamente, seja por graus. Que as formas indicativas de corolários possam igualmente aparecer depende da natureza da mente do estudante – conforme seja ele ou não apto a perceber rapidamente tudo o que deflui de determinada ideia. 
    Como regra geral, em um bom estudante a imagem da ideia central reproduzir-se-á com muita exatidão no mesmo instante, e as imagens ao redor lhe surgirão, uma por uma, quando o estudante revolve a ideia na mente. Mas, infelizmente, com muitas pessoas até mesmo a ideia central não se apresenta bem. Menos desenvolvidas mentalmente, não podem fazer uma reflexão nítida, e criam uma espécie de massa amorfa e incorreta, em vez de uma figura geométrica. Outras criam algo que se reconhece ser a mesma forma, mas com arestas e ângulos embotados ou com uma parte inteiramente fora de proporção com o resto – uma imagem mal desenhada, em suma. 
    A outros sucede construírem uma espécie de esqueleto, significando que aprenderam os traços gerais da ideia, mas se revelam ainda incapazes de lhe dar vida ou de preencher algumas de suas minúcias. Outros – e talvez a classe mais numerosa – tocam um lado da ideia e não o outro, e assim constroem a forma somente pela metade. Há ainda os que percebem um ponto e esquecem todo o resto, gerando desse modo uma figura que pode ser exata nesse ponto, mas não é reconhecível como uma reprodução da do livro. Todos eles, no entanto, afirmarão haver estudado o livro; mas, se lhes pedirmos que nos reproduzam de memória o seu conteúdo, as tentativas nesse sentido pouco terão de comum com o assunto. 
    Em primeiro lugar, isso quer dizer falta de atenção. Essas pessoas, é de presumir, leem as palavras, mas as ideias que estas exprimem não se fixam em suas mentes. Muitas vezes, ao clarividente é fácil perceber a razão, pois verá o corpo mental do estudante ocupado com meia dúzia de assuntos ao mesmo tempo. Os trabalhos de casa, os aborrecimentos de negócio, a lembrança de um prazer recente ou a expectativa de um próximo, um sentimento de fadiga e de enfado por ter de estudar e o desejo de chegar ao momento final da meia hora de estudo, tudo absorve nove décimos da matéria do corpo mental do leitor, fervilhando no seu cérebro, enquanto o pobre décimo restante faz um desesperado esforço para aprender a forma-pensamento que ele pretendia assimilar do livro. Em tais circunstâncias, é natural que não se possa esperar nenhum benefício real; e, para resumir, seria provavelmente melhor que ele não tentasse estudar. 
Assim, do exame deste lado oculto do estudo ressaem certas regras definidas que seria conveniente o estudante observar. Primeiro. Começar esvaziando a mente de todos os demais pensamentos, não permitindo que a eles retornem enquanto não terminado o estudo. Libertar a mente de todas as preocupações e perplexidades, concentrando-se totalmente na matéria em estudo. Ler o parágrafo lenta e atentamente, fazendo uma pausa para ver se a imagem está clara em sua mente. Depois, prosseguir na leitura com o mesmo cuidado, vendo se as linhas adicionais se ajustaram à sua imagem mental. Repetir a leitura até sentir que se assenhoreou completamente do assunto, e que nenhuma ideia nova a esse respeito foi imediatamente sugerida. Isso feito, pode utilmente ver se lhe é possível encontrar algum dos corolários, se pode rodear sua forma-pensamento central de planetas subordinados. 
    Durante todo esse tempo, insistirá uma multidão de outros pensamentos em serem admitidos; mas, se o nosso estudante é digno deste nome, os afastará energicamente, conservando a mente fixada exclusivamente no assunto. A forma-pensamento original que descrevi representa a concepção do autor, tal como ele escrevia, e sempre é possível, mediante um estudo acurado, manter assim contato com a mente do autor. Não raro pode este ser alcançado através de sua forma-pensamento, obtendo-se informação suplementar ou fazendo-se luz em pontos difíceis. Comumente não pode o estudante, a menos que seja altamente desenvolvido, entrar em consciente comunicação com o autor, ao ponto de realmente trocar ideias com ele; qualquer ideia nova provavelmente aparecerá como sua própria, porque vem sempre de cima para o seu cérebro, tanto quando é sugerida de fora como quando se origina em seu próprio corpo mental. Isso, porém, não importa, desde o instante em que o estudante adquira uma compreensão clara do objeto."

C. W Leadbeater, O Lado Oculto das Coisas, Ed. Teosófica, Brasília, 2017, pgs. 267/270