IMAGINAÇÃO E REALIDADE

                     O que é a imaginação? O que é o raciocínio? N. Sri Ram, neste capítulo do seu livro "Um Vislumbre da Realidade", Editora Teosófica, nos leva a refletir sobre todos os aspectos que envolvem a imaginação e até onde ela nos leva. Pode ela nos levar para regiões "feonteiriças entre o conhecido e o desconhecido"?



                            "A imaginação é uma faculdade que alcança acima e além dos níveis de observação e raciocínio, preeminentemente a faculdade que constrói pontes no mundo mental e mesmo no físico. Ela é, na verdade, um poder divino, pois cria na mente coisas que podem posteriormente ser materializadas sob uma forma ou outra. Nós observamos com os sentidos, embora essa atividade não seja puramente sensorial, uma vez que a mente penetra cada observação individual. Quando olhamos para uma superfície, digamos as paredes de um edifício e formamos uma imagem ou quadro em três dimensões, essa imagem é construída a partir dos elementos que recebemos dessa superfície. Existem as impressões de linha, cor, altura, extensão, textura, etc., que são fotografadas primeiramente em nossa visão e depois no nosso cérebro, mas toda a perspectiva é dada por uma mente que não apenas percebe o que está diante de si, como também desenha na memória para construir o quadro composto. Assim, há o uso da imaginação na observação das coisas, caso contrário nada obteríamos senão fragmentos de impressões não relacionados.

A imaginação não é idêntica em todos os seus aspectos à visualização. Esta assemelha-se a um foco adequado; quando prestamos atenção, ela automaticamente foca a mente e esse foco produz um quadro perfeitamente claro, como é o caso na fotografia. A mente possui uma natureza que, com relação às coisas da matéria ou, em geral, aos objetos de atenção, age como um mecanismo perfeito. O raciocínio e procedimentos matemáticos são mecânicos e, portanto, parece possível usar um computador para eles. Mas a imaginação é menos fixa e inclui a captura de ideias mais amplas, mais sutis, que parecem subjazer ou invisivelmente presidir o primeiro plano percebido, e sua materialização. É com uma imaginação que não apenas projeta ideias preexistentes que penetramos na região fronteiriça entre o conhecido e o ainda desconhecido; não o âmago do desconhecido, ou todas suas vastas extensões, mas seu horizonte próximo, no qual as coisas que lá estão, são ainda apenas formas embaçadas ou espíritos do ar que quase se pode sentir, mas que logo nos serão revelados à luz da objetividade. Sentimos algo que, como o tempo, manifesta-se à nossa visão clara e assume uma forma objetiva. É com a sensibilidade sutil inerente à natureza da consciência e à sua ação – e essa ação é a imaginação – que se percebe um segundo plano, a princípio não sentido, e nuances de diferenças, que revelam novas figuras e contornos. Sem essa sensibilidade, que é atraída como uma agulha imantada à verdade do que é, a imaginação seria mera fantasia, “a criação sem fundamento de uma visão”. A imaginação da verdade é semelhante à percepção, embora possa também criar formas que expressem uma qualidade da verdade não descoberta até agora. A imaginação move-se como aquela agulha às expensas da memória, e expõe analogias entre fenômenos ou processos aparentemente não relacionados, e neles vê reflexos de um padrão invisível comum. É pela sensibilidade, que é a base da reta imaginação, que se apreende em qualquer medida a natureza interna de uma coisa, guiada até ela por seus sinais e manifestações externos.

Todo raciocínio, todo pensamento é a criação explícita de relacionamentos que são implícitos às coisas ou fatos observados, mas é com a imaginação que construímos um todo a partir das diferentes partes. A palavra imaginação” implica a criação de imagens. Todo pensamento move-se através de imagens. Mesmo que pensemos em uma abstração – o significado de um símbolo matemático, por exemplo, – também assume alguma forma ou figura em nossas mentes. A imaginação tem uma dimensão que não está presente no raciocínio, porque ela cria e não meramente registra. Para erigir um edifício que estará situado sobre o terreno dos fatos ela deve seguir de mãos dadas com sua irmã prosaica, a mente lógica.

O que, exatamente, acontece quando imaginamos? Imaginamos com base nas impressões recebidas, que são as coisas que ouvimos, vemos, tocamos, cheiramos, saboreamos e sentimos. Certamente que impressões novas são recebidas constantemente. Há também as ideias por elas evocadas. Quando tentamos criar algo novo, selecionamos algum material e o colocamos em certo molde por meio de um rearranjo de seus elementos. O material em si não é novo, pois ele já está presente, mas aquilo que moldamos a partir dele é novo. Uma hipótese é também uma construção da mente, mas baseada em fatos, e seu objetivo é revelar suas relações ocultas e assim explicar a importância de tais fatos.

Quando falamos da imaginação como um dom especial, um nobre atributo, pensamos naturalmente nas realizações do gênio. É a imaginação que dá amplitude e altitude à mente."


N. Sri Ram, Um Vislumbre da Realidade, Editora Teosófica, pgs.  95